Personagem controverso para a fé cristã, a figura do Judas segue
presente na tradição popular e no comércio de rua na Capital. O Vida & Arte
reúne hoje relatos de brincantes e vendedores que defendem a
"queimação"
Há 25 anos trabalhando na confecção e venda de bonecos de pano, Jean
Carlos Alves, 40, já viu Judas ser comprado para virar segurança de empresa. “O
cliente comprou para fingir que era o vigia da loja dele e deixou ele (o
boneco) o ano todo lá parado, parece que deu certo”, conta o homem que
transformou a brincadeira aprendida com os avós em ofício. Segundo a tradição
cristã, Judas traiu Jesus, entregando-o para seus algozes. Na cultura popular,
a queimação do apóstolo é tradição que vem atravessando séculos. Já no Ceará, o
costume virou também molecagem.
“Todo ano a gente faz a malhação do Judas. É um momento de brincadeira,
de união familiar”, afirma Sávio Pitta, 35, corretor de imóveis, contando que a
família dele vai sempre para uma casa de praia no Cumbuco, onde a queimação
acontece. Em anos anteriores, Sávio investiu na compra de um Judas temático,
com o personagem estampando o rosto de algum político. Em 2016, porém, ele preferiu
um boneco tradicional. “Estamos num momento político muito complicado e como
tem muitas opiniões políticas diferentes entre a família e os amigos resolvemos
que seria um Judas normal”, afirma.
Cliente do vendedor Jean Carlos, que é conhecido como Zé do Judas,
Sávio defende a permanência da malhação no imaginário popular cearense. “É uma
tradição que vale ser mantida, porque tem todo o simbolismo da Páscoa, é uma
brincadeira que eu passo para meus filhos”, defende.
No cruzamento entre as avenidas Raul Barbosa e Murilo Borges, Jean
vende os bonecos por valores que chegam a R$ 200. “As pessoas querem um Judas
bem feito. O meu não é só de pano não, tem uma estrutura de arame, madeira”,
conta, ressaltando que a “credibilidade” do seu trabalho tem mantido cliente
fieis. O perfil dos compradores? Homens acima dos 40 anos e de classe média.
“Eu não acho que essa tradição vai acabar não. É igual fogueira na época do São
João, tem que continuar fazendo, é a nossa cultura”, pondera.
Já Haroldo Abreu, 53, que comercializa os bonecos no cruzamento das
avenidas Borges de Melo e Luciano Carneiro, afirma que esse legado popular tem
se restringido mais ao interior do Estado. “90% das minhas vendas são para
pessoas que vão levar para o Interior, nos bairros daqui (Fortaleza) está muito
fraco”, reclama. “É uma brincadeira sadia, que os jovens estão esquecendo”,
completa.
Felício da Silva, integrante da Companhia Teatral Acontece, também
defende a permanência do ritual em torno do personagem bíblico conhecido como traidor.
“A gente faz um cortejo pelo bairro Faris Brito e sai coletando prendas com os
populares para depois fazer a brincadeira do testamento dele, distribuindo o
que foi arrecadado”, conta. Todos os anos, o grupo teatral realiza
apresentações durante a Semana Santa. “A gente faz a Paixão de Cristo, mas faz
também a queimação do Judas para completar o Ciclo Pascoal”, celebra.
SERVIÇO
Queimação
de Judas da Companhia Teatral Acontece
Quando: hoje, a
partir das 16 horas
Onde: cortejo sai
pelas ruas dos bairros Farias Brito e Monte Castelo, partindo da rua João Tomé





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