A doação de um terreno público de aproximadamente 18
mil m² à Diocese de Sobral para a construção do Santuário da Divina
Misericórdia e de um Centro de Pastoral e Promoção Humana abriu uma nova frente
de debate no município. O projeto, de autoria do Executivo municipal, foi
aprovado pela Câmara de Vereadores no último dia 15 de setembro e garante à
Diocese um prazo de até três anos para concluir as obras previstas.
A área, localizada no bairro Antônio Carlos Belchior
e conhecida como Parque do Angico, é utilizada há quase dez anos por
comunidades religiosas de matriz afro-indígena, incluindo praticantes de
Umbanda, Jurema Sagrada, Wicca e Druidismo para a realização de rituais e
práticas culturais. A decisão do poder público de ceder o espaço gerou protestos
de representantes desses grupos, que alertam para o risco de apagamento
religioso e violação da liberdade de culto.
Alan Cardé, morador do entorno e um dos
colaboradores na preservação da área verde, destacou que a situação representa,
em sua avaliação, um caso de intolerância religiosa: “No momento, a gente está
nessa disputa, que eu entendo que seja intolerância religiosa por parte da
Igreja, tendo em vista que a própria instituição possui muitos terrenos e
poderia construir esse santuário em outro local.”
Além de sua dimensão cultural e espiritual, o local
é reconhecido por sua relevância ambiental. A área abriga mata ciliar
preservada, um córrego perene e um conjunto diversificado de fauna e flora.
Estudos e relatos de biólogos apontam a existência de árvores centenárias e a
identificação de mais de 50 espécies de pássaros, entre elas o Gavião-Carijó,
reforçando a preocupação quanto aos possíveis impactos da construção no
equilíbrio do ecossistema local.
O Ministério Público foi notificado sobre o caso e
acompanha os desdobramentos iniciais. A mobilização ganhou força após a visita,
nesta segunda-feira (1º), do Comitê da Bacia Hidrográfica do Acaraú e do
deputado estadual Renato Roseno, que vêm articulando ações para pressionar pela
preservação do território e pela ampliação das áreas verdes. Roseno afirmou que
irá acessar os procedimentos já abertos no Ministério Público, com o objetivo
de contribuir para a responsabilização do município quanto à criação e
preservação da área verde em Sobral. Segundo ele, “é importante que essa área
institucional se transforme em área verde, uma unidade de conservação
municipal.”
Entre os pontos levantados pelos grupos contrários
ao projeto estão a necessidade de assegurar o equilíbrio ambiental da área, o
respeito às manifestações religiosas já estabelecidas no território e a busca
por alternativas que conciliem interesse público, preservação e diversidade
cultural. Paralelamente, cresce a expectativa sobre a atuação das instituições
responsáveis e sobre os próximos passos do processo, que deve continuar
repercutindo dentro e fora da cidade.
A bióloga Maria Ribeiro, uma das defensoras da
preservação do Parque do Angico, destaca que, no município de Sobral, as matas
ciliares são protegidas sob a forma de parques lineares. Ela acrescenta que um
grupo de cientistas entregou ao Ministério Público um parecer técnico indicando
que a área em questão possui funcionalidade de corredor ecológico.
Entramos em contato com a Diocese de Sobral para
esclarecimentos, e a instituição informou, por meio de sua assessoria, que não
há qualquer prática de intolerância religiosa, ressaltando que a Igreja
Católica preserva a unidade entre todos. Sobre a questão ambiental, esclareceu
ainda que a quase-paróquia Divina Misericórdia apenas recebeu a área como
doação, não tendo qualquer outro tipo de envolvimento no caso.
Redação sobral.com





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