quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Doação de área pública à Diocese gera disputa religiosa e ambiental em Sobral

 

Foto: Wellington Bessa

A doação de um terreno público de aproximadamente 18 mil m² à Diocese de Sobral para a construção do Santuário da Divina Misericórdia e de um Centro de Pastoral e Promoção Humana abriu uma nova frente de debate no município. O projeto, de autoria do Executivo municipal, foi aprovado pela Câmara de Vereadores no último dia 15 de setembro e garante à Diocese um prazo de até três anos para concluir as obras previstas.

A área, localizada no bairro Antônio Carlos Belchior e conhecida como Parque do Angico, é utilizada há quase dez anos por comunidades religiosas de matriz afro-indígena, incluindo praticantes de Umbanda, Jurema Sagrada, Wicca e Druidismo para a realização de rituais e práticas culturais. A decisão do poder público de ceder o espaço gerou protestos de representantes desses grupos, que alertam para o risco de apagamento religioso e violação da liberdade de culto.

Alan Cardé, morador do entorno e um dos colaboradores na preservação da área verde, destacou que a situação representa, em sua avaliação, um caso de intolerância religiosa: “No momento, a gente está nessa disputa, que eu entendo que seja intolerância religiosa por parte da Igreja, tendo em vista que a própria instituição possui muitos terrenos e poderia construir esse santuário em outro local.”

Além de sua dimensão cultural e espiritual, o local é reconhecido por sua relevância ambiental. A área abriga mata ciliar preservada, um córrego perene e um conjunto diversificado de fauna e flora. Estudos e relatos de biólogos apontam a existência de árvores centenárias e a identificação de mais de 50 espécies de pássaros, entre elas o Gavião-Carijó, reforçando a preocupação quanto aos possíveis impactos da construção no equilíbrio do ecossistema local.

O Ministério Público foi notificado sobre o caso e acompanha os desdobramentos iniciais. A mobilização ganhou força após a visita, nesta segunda-feira (1º), do Comitê da Bacia Hidrográfica do Acaraú e do deputado estadual Renato Roseno, que vêm articulando ações para pressionar pela preservação do território e pela ampliação das áreas verdes. Roseno afirmou que irá acessar os procedimentos já abertos no Ministério Público, com o objetivo de contribuir para a responsabilização do município quanto à criação e preservação da área verde em Sobral. Segundo ele, “é importante que essa área institucional se transforme em área verde, uma unidade de conservação municipal.”

Entre os pontos levantados pelos grupos contrários ao projeto estão a necessidade de assegurar o equilíbrio ambiental da área, o respeito às manifestações religiosas já estabelecidas no território e a busca por alternativas que conciliem interesse público, preservação e diversidade cultural. Paralelamente, cresce a expectativa sobre a atuação das instituições responsáveis e sobre os próximos passos do processo, que deve continuar repercutindo dentro e fora da cidade.

A bióloga Maria Ribeiro, uma das defensoras da preservação do Parque do Angico, destaca que, no município de Sobral, as matas ciliares são protegidas sob a forma de parques lineares. Ela acrescenta que um grupo de cientistas entregou ao Ministério Público um parecer técnico indicando que a área em questão possui funcionalidade de corredor ecológico.

Entramos em contato com a Diocese de Sobral para esclarecimentos, e a instituição informou, por meio de sua assessoria, que não há qualquer prática de intolerância religiosa, ressaltando que a Igreja Católica preserva a unidade entre todos. Sobre a questão ambiental, esclareceu ainda que a quase-paróquia Divina Misericórdia apenas recebeu a área como doação, não tendo qualquer outro tipo de envolvimento no caso.

Redação sobral.com


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